Torres equipadas com câmeras de vigilância são cada vez mais comuns em frente a prédios residenciais e comerciais em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Embora promovidas como um reforço à segurança, a proliferação desses equipamentos levanta questionamentos sobre a transparência no uso das imagens, a proteção de dados e a real contribuição para a redução da criminalidade.
Preocupações com privacidade e uso de dados
De acordo com Daniel Edler, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP), a ausência de regulamentação específica gera preocupações sobre o uso indevido das informações coletadas. “Os dados podem servir à segurança corporativa ou à produção de informações privadas sem qualquer controle do cidadão”, alerta. Rafael Rocha, coordenador de projetos do Instituto Sou da Paz, complementa: “É preciso ter um controle mais rigoroso sobre o acesso a essas informações, porque estamos falando de empresas privadas que lidam com imagens de muitas pessoas.”
A expansão dessas tecnologias de vigilância ganhou força a partir de 2019, após a implementação de sistemas de reconhecimento facial em eventos como os carnavais de Salvador e do Rio de Janeiro, conforme explica Pablo Nunes, coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC). A crescente sensação de insegurança da população – a violência é a principal preocupação para 28% dos brasileiros, segundo pesquisa da Quaest encomendada pela Genial Investimentos – impulsiona a demanda por soluções de segurança.
Como funcionam as torres de vigilância
Empresas como CoSecurity (Grupo Haganá), Gabriel e White Segurança oferecem as torres, que monitoram o entorno dos prédios e permitem que os moradores acessem as imagens por meio de aplicativos, com histórico de até 14 dias em alguns casos. Alguns modelos incluem um botão de pânico que aciona a polícia ou o Corpo de Bombeiros. O custo varia entre R$ 389 e R$ 1.500 mensais por unidade, dependendo do modelo e dos recursos.
Integração com programas de segurança pública
As câmeras não realizam reconhecimento facial, mas as gravações podem ser compartilhadas com a polícia mediante solicitação formal. Em São Paulo, as empresas integram seus equipamentos a programas públicos como o Smart Sampa (prefeitura) e o Muralha Paulista (governo estadual), auxiliando na identificação de procurados e veículos roubados. O Smart Sampa já reúne 40 mil câmeras, incluindo pelo menos 20 mil de condomínios e empresas parceiras. A CoSecurity, por exemplo, é responsável por cerca de 8 mil câmeras, o que representa 25% da rede.
No Rio de Janeiro, a Gabriel afirma fornecer imagens em tempo real ao Centro Integrado de Comando e Controle (CICC) e repassar registros à polícia quando solicitado. Ambas as empresas alegam ter contribuído para a solução de crimes nas cidades onde atuam, com a recuperação de veículos e a prisão de suspeitos.
Eficácia questionada e necessidade de regulamentação
Apesar dos investimentos, a eficácia das torres de vigilância é questionada por especialistas em segurança pública. Eles ressaltam a falta de estudos que comprovem a redução da criminalidade e a ausência de transparência no uso dos dados. Thallita Lima, coordenadora do projeto O Panóptico, que monitora o uso de tecnologias de vigilância no Brasil, destaca a falta de padronização técnica e o impacto no espaço urbano, com a instalação de totens nas calçadas.
Além disso, há relatos de frustração com a tecnologia, como o caso de um condomínio em São Paulo onde moradores recorreram a vasos de plantas para tentar evitar roubos de celular na portaria. A polícia, segundo os especialistas, não tem estrutura para investigar todos os crimes patrimoniais, mesmo com o apoio das imagens fornecidas pelas empresas. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) considera o tema prioritário e planeja discutir a questão, com ênfase em biometria facial, no biênio 2025-2026.











