Jair Montes realiza audiência pública para debater luto materno e parental

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Jair Montes realiza audiência pública para debater luto materno e parental

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O deputado Jair Montes (Avante) conduziu, nesta quinta-feira (08), no plenário da Assembleia Legislativa, uma audiência pública para discutir o luto materno e parental. A audiência atende à um pedido da psicóloga Elizete Gonçalves e da advogada Tainá Amorim.

O deputado iniciou a audiência ressaltando a importância do tema, e destacou que no momento em que vivemos, em meio à pandemia da Covid-19, reforçou a necessidade de refletir sobre a importância da vida e das relações entre seres humanos. O parlamentar destacou que é preciso garantir a dignidade das mães que perderam seus filhos, e também dos fetos natimortos, de maneira a garantir que todo ser humano seja tratado como deve.

Segundo o deputado, a intenção do evento é refletir sobre o tema para elaborar um projeto de lei, baseado na discussão levantada pelos profissionais convidados, que irá garantir o acolhimento humanizado à mães e pais que sofreram com a perda gestacional assim como assegurar a certidão de óbito de natimortos.

A psicóloga Elizete Gonçalves, que solicitou do deputado a realização da audiência pública, foi a primeira a iniciar os debates, fazendo um relato sobre o luto parental, seus efeitos sobre as famílias e os indivíduos e a falta de políticas de amparo para essas pessoas.

“O que se perde quando um pai e uma mãe perdem um filho? Quando se decide gerar uma criança, se carrega uma série de sonhos e de realizações. A perda de um filho é algo inominável. Não há dor maior nem mais terrível, do que a dor de perda de um filho, por afetar laços e vínculos”, disse.

Ainda segundo ela, “não existe a figura do ex-pai ou da ex-mãe. Há um forte sentimento de culpa que os pais enfrentam quando perdem um filho. Eles precisam de apoio e que sejam criados espaços para que eles contem suas histórias. Não temos isso hoje e causa um prejuízo emocional muito grande”.

Ela declarou ainda que “a morte de um filho de forma trágica, violenta e inesperada, gera ainda mais transtornos. A morte de um filho, independente de sua idade, é devastadora e pode gerar ainda mais problemas”.

De acordo com Luciana Pereira Magalhães, psicóloga da Maternidade Mãe Esperança, de Porto Velho, os casos de luto por perda gestacional ou natimortos são frequentes na unidade, que é de responsabilidade do município de Porto Velho. “Essa é uma vivência que temos aqui na maternidade com uma demanda frequente, onde temos que trabalhar o luto, mas não existe um protocolo de atendimento definido a ser seguido. Nós recebemos a comunicação do óbito e fazemos o atendimento dentro do centro cirúrgico, na sala de parto, de pós-parto e depois no alojamento conjunto, com o encaminhamento para atendimento externo. Porém, muitas vezes também fazemos o atendimento pós-alta, em função do município ou do estado ter dificuldade deste tipo de atendimento.

A psicóloga também reafirmou a importância de se criar um protocolo padrão de atendimento e a necessidade do estado investir na sequência do atendimento, depois do parto. “É importante que se crie um protocolo de atendimento para padronizar as ações da área, mas também é necessário que seja fortalecido o atendimento externo para que a paciente e os familiares possam ter um acompanhamento psicológico enquanto durar o luto”, afirmou.

Representado o Conselho Regional de Rondônia (Cremero) o psiquiatra Persio Lima reconheceu que o tema tratado na audiência é considerado um assunto difícil para ser debatido, uma vez que, segundo ele, muitos fingem que não existir. O médico disse que é preciso entender o quanto uma pessoa pode vir a adoecer por fruto de um trauma vivido na sua experiência de vida.

“Nós, enquanto médicos psiquiátricos sabemos que uma pessoa que perde um filho, perde um pedaço de si, e apesar do pós-trauma, ela seguirá com sua vida, mas jamais será a mesma. Acredito que quatro anos não é um prazo superável, até porque estamos falando de algo que não se supera, ela apenas continua com sua vida, apesar da perda que ela sofreu”, disse o médico.

Ainda segundo Persio Lima, é de se questionar o fato de os traumas serem individuais. “Por que é tão diferente, de uma pessoa para a outra, a forma de lidar com a perda se são traumas iguais, e por que cada uma apresenta respostas tão diferentes, sintomas diferentes, por que algumas precisam de mais tempo, outras não, algumas apresentam sintomas físicos, outras não. A verdade é que esses pais ficam sem chão e não há muito o que ser dito porque é realmente algo irreparável”, afirmou o psiquiatra.

Taciana Holtz, representante do Conselho Regional de Enfermagem – COREM, destacou que é necessário realizar o acompanhamento das mães que perdem bebês desde o início do processo, antes mesmo de deixar a unidade hospitalar. A enfermeira relatou que, em muitos casos, as mulheres estão sedadas no momento do parto e o trauma é intensificado, pois acordam já sem seus filhos. Ela ressaltou a importância de realizar cuidados psicológicos ainda no período intra-hospitalar, e que a falta desse cuidado por acarretar até mesmo em recaídas de problemas físicos por essas mães.

A advogada e especialista em violência obstétrica Tainá Amorim disse que “a assistência precisa ser integral, conforme a garantia dada pela Constituição Federal. Que o Governo e o município de Porto Velho tenham um olhar diferenciado. Hoje, se coloca mulher que perdeu o bebê, junto com mulher que está amamentando o seu recém-nascido. Isso é cruel, é torturador e precisa ser melhor trabalhado essa situação”.

Segundo ela, “temos a mulher que perdeu um natimorto, mas temos a mãe que perdeu um feto com três meses, que é descartado como lixo hospitalar. É preciso que os hospitais ofereçam um atendimento para esse público. Não existe uma visualização daquele bebê esperado. Muitas mulheres saem da maternidade e não sabem ainda que existe uma lei que garante o registro de um natimorto, com o nome escolhido pela família”.

Representando a Secretaria de Estado da Assistência Social (Seas) Vinicius Bruno Afonso destacou que o atendimento psicológico para famílias que passam por essa situação de luto pós-parto precisa ser melhorado em todo o estado, uma vez que as mães e famílias que passam por esse sofrimento não recebem o tratamento necessário. Ele sugeriu uma proposição de lei por parte da Assembleia Legislativa que ajude na implementação deste atendimento, bem como aporte de recursos para contratação de profissionais e adequação de espaços. Vinicius informou ainda que a Seas possui um programa de atendimento a mães de bebês vivos, com entrega de kits e apoios a gestantes, mas que precisam ser buscadas alternativas para que os casos de morte de bebês ou fetos sejam reduzidos em todo o Estado.

A advogada Leilane Montes, disse saber bem sobre a dor do luto parental e relatou as consequências da sua perda enquanto mãe. “Eu fiquei me questionando onde eu errei, onde falhei como mãe e por muitas vezes chorei sozinha, calada. Acreditei que enfrentaria uma depressão por achar que não conseguiria mais engravidar, mas graças ao acolhimento que tive da minha família, do meu esposo, que chorou o luto ao meu lado, e por isso posso confirmar o quão importante é este tema debatido aqui nesta manhã”, ressaltou Leilane.

A assistente social Érica Fontenele, representando o Hospital Cosme e Damião, relatou que a instituição conta com uma equipe multidisciplinar que presta atendimento às mães, no entanto, existem muitos casos em que os bebês recém-nascidos estão internados na UTI, sem a presença da mãe no hospital. A assistente social relatou que foi estabelecido um protocolo para dar a notícia aos pais e encaminhar para atendimento psicológico adequado, mas que a equipe não sabe se o tratamento continua sendo realizado quando os pais deixam a unidade.

Érica se colocou à disposição da Seas para apresentar o funcionamento desses protocolos para que possam, eventualmente, servirem de referência para implantação em outras unidades de saúde do Estado.

Para a Advogada Ilza Nayara, o tema acaba sendo bem mais abrangente e complexo do que se imagina, mas que são ações e discussões como a desta audiência que ajudam a demonstrar a relevância do tema e buscar alternativas para poder amenizar um pouco mais a dor dessas mães. Pedagoga por formação, a advogada também lembra que muitas vezes essas mães que perdem o filho no parto ou no período de gestação, muitas vezes também possuem outros filhos em idade escolar e que são muitos os relatos que essas mães entram em condição depressiva e acabam não conseguindo dar o apoio necessário aos outros filhos, que também precisam da atenção. “Isso aumenta a angústia da mãe, abala a família toda, todos sofrem e se não tiver um acompanhamento, acaba desestruturando toda a família”.

Ela deixou como sugestão para a secretaria de estado de educação, bem como para as secretarias municipais de educação, para que sejam desenvolvidos projetos nas escolas através do Serviço de orientação escolar, para que acolham essas mães e essas crianças, “pois sabendo da situação que a família passa e que a escola vai tratar seus filhos de uma maneira adequada, elas consigam sentir pelo menos um pouco mais de conforto e isso vai ajudar numa recuperação mais breve do luto em que vive.

O secretário adjunto da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), Nélio Santos, após relatar algumas experiências vividas dentro da sua família, enalteceu a iniciativa do deputado Jair Montes por expor o tema para debate, parabenizou a fala dos demais participantes e sugeriu que seja dada a devida importância ao assunto.

“Por parte da Sesau, enquanto gestor, acredito que devemos olhar para este tema com mais relevância, envolver mais autoridades e elaborar mais propostas de acolhimento e tratamento, quando estes forem necessários, para essas famílias que passam por esse processo de luto parental, visando um suporte emocional e psicológico para que possam superar essa dor, ou aprender a viver com a dor que, muitas vezes, acaba afastando esses pais da sociedade e dos demais entes da família”, disse Nélio Santos.

A técnica do Núcleo Materno Infantil do Grupo de Trabalho da Estimulação Precoce (GPES) da Sesau, Patrícia Nienow, iniciou sua participação parabenizando a todos pela atenção dada ao tema em questão e disse que, enquanto área técnica, existem desafios com relação à qualidade na assistência necessária para as famílias que vivenciam o luto parental.

“Dentro dessa lei que propõe a audiência, precisamos pensar como será qualificado os serviços que já prestamos no Estado. Temos um total de 23 unidades hospitalares que realizam partos e nascimento pelo SUS, porém, apenas três possuem pelo menos um psicólogo ou assistente social que atua dentro desse serviço. Na grande maioria não contamos com uma equipe multiprofissional que dê conta de atender essa demanda. Não estou dizendo que abordar e trabalhar a questão do luto seja uma responsabilidade só do psicólogo ou da assistente social, mas sim, de toda a equipe da assistência. Para isso, precisamos de pessoas que trabalhem isso com os demais profissionais da saúde. Infelizmente temos enfrentado um déficit de profissionais imenso nesse processo”, enfatizou Patrícia Nienow.

Para ela, é preciso pensar em estratégias que sejam possíveis melhorar o atual cenário. “Quem sabe pensarmos em um processo de apoio matricial, onde psiquiátricas ou psicólogos possam atuar com a atenção primária, que é a equipe que está mais próxima da população, ou seja, qualificar esses profissionais para dar atenção a essas mães e esses pais é fundamental”, concluiu.

A defensora pública Débora Machado Aragão destacou que os pontos levantados pelos participantes da audiência se juntam à uma outra causa que vem sendo foco da Defensoria Pública que é o combate à violência obstétrica. Ela afirmou que grande parte do problema é a falta de informação e orientação dos profissionais da saúde e colocou o Núcleo Especializado de Proteção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública à disposição para dar seguimento aos procedimentos necessários para auxiliar na capacitação desses profissionais e garantir o tratamento humanizado às mães e pais que sofreram com a perda gestacional.

Em um vídeo encaminhado à audiência pública, a presidente da ONG gaúcha Associação Amada Helena, Tatiana Maffini destacou o sofrimento real de uma mãe que perde um filho, seja antes ou depois do parto. No caso dela, a perda foi da filha Helena, com 12 dias de vida, por falta de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal, em 2012 e pelos relatos, falta preparo profissional e estrutura para a acolher uma mãe ou uma família que sobre com esta situação.

“Mães e pais que sofrem com a perda de um filho, seja durante a gestação, seja depois do nascimento, guardam um luto eterno e não querem da sociedade o sentimento de pena, precisam de um acolhimento profissional, psicológico. Precisam de um amparo humano, de um tratamento especial, com sensibilidade, pois mesmo um feto, uma criança recém-nascida ou até um adulto, para os pais, é sempre um filho que se foi e sempre fará falta. É preciso que exista uma política pública de acompanhamento e acolhimento destas mães, pais e parentes, para que o sofrimento seja minimizado e não se transforme em algo ainda maior”, concluiu.