07 de setembro de 2024

Pesquisadores destacam dificuldades no acesso ao aborto legal no SUS

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Pesquisadores destacam dificuldades no acesso ao aborto legal no SUS

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Evento na Fiocruz discute a importância do acesso ao aborto legal para a saúde pública

Nesta quarta-feira (3), a Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP), da Fiocruz, sediou um debate crucial sobre o acesso ao aborto legal no SUS, coordenado pelo grupo Observatório do SUS. O evento, realizado no Rio de Janeiro, reuniu pesquisadores e especialistas para discutir os desafios enfrentados pelas mulheres no sistema público de saúde.

Projeto de Lei 1904/2 em foco

O debate teve como referência o Projeto de Lei 1904/2, que propõe a autorização de abortos legais até 22 semanas de gestação, mesmo em casos de violência sexual, e aumenta a pena máxima para quem realiza o procedimento, equiparando-o ao homicídio.

Críticas à demora no atendimento

Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco (UPE), criticou a burocracia que impede o acesso das mulheres ao aborto legal: “Não existe estuprada que, por maldade, vai levar a gestação até 22 semanas porque quer ver o feto nascer prematuro, sofrer, ir para a UTI e ficar sequelado. Ela deixou chegar até esse ponto por causa do Estado brasileiro, que fechou todas as portas”.

A necessidade de justiça social reprodutiva

Debora Diniz, antropóloga e professora da Universidade de Brasília, destacou a necessidade de avançar na luta por justiça social reprodutiva, enfatizando a importância do conhecimento científico no debate sobre o aborto. “A questão do aborto, como outras em saúde pública, não é matéria de contra ou a favor. As religiões têm que ser respeitadas, mas não são elas que determinam a vida pública e o bem comum”, afirmou.

Mobilização da sociedade civil

Elda Bussinguer, presidenta da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), defendeu uma reação pública da sociedade civil contra o projeto de lei, que ela vê como uma tentativa de controle sobre os corpos femininos. “Esse é um projeto de poder sobre os corpos femininos, de silenciamento das mulheres. Precisamos quebrar o pacto de silêncio que mantém milhares de meninas espalhadas por esse país sendo violentadas todos os dias”, declarou.

Aborto legal no Brasil

A legislação brasileira permite o aborto em casos de gravidez decorrente de estupro, risco de vida para a mulher e anencefalia fetal. No entanto, a aplicação prática desses direitos ainda enfrenta muitos obstáculos. “É uma política escondida. Dependendo do gestor no comando, ela desaparece, fica escondida”, disse Olímpio Moraes, destacando que apenas 3,6% dos municípios oferecem serviços de aborto previstos em lei.

Desinformação e demora no atendimento

Moraes ressaltou que apenas 6 das 27 unidades federativas disponibilizam informações públicas sobre aborto nos sites das secretarias de saúde, e que uma gestante pode levar de dois a três meses para encontrar um programa que a acolha. As mulheres mais prejudicadas por essa situação são as jovens, pobres e negras.

Formação médica e objeção de consciência

O diretor da UPE também abordou a questão da objeção de consciência entre médicos obstetras, argumentando que profissionais do SUS devem cumprir a legislação: “Médicos do SUS não estão aí para defender crenças. O nosso patrão é o Estado brasileiro. Quem paga é o SUS. Estamos trabalhando para que não haja essa desculpa, que não é aceitável”.