Nos rios da Amazônia, assim como em qualquer via navegável, a atenção e o cuidado são essenciais. Mas, infelizmente, naufrágios como o da lancha ‘Tupana’, no rio Madeira em outubro de 1945, são lembranças dolorosas e importantes para a história da navegação na região.
A ‘Tupana’ pertencia à Companhia Amazonense de Navegação e fazia a rota regular entre Manaus (AM) e Porto Velho (RO), com paradas em diversas cidades do interior dos dois estados. A embarcação era vital para conectar comunidades e transportar pessoas e mercadorias na época.
O acidente resultou na morte de dezenas de passageiros e tripulantes, sendo um dos maiores desastres registrados no transporte fluvial da época. A tragédia chocou a região e levantou questionamentos sobre a segurança das embarcações.
Na manhã de 2 de outubro de 1945, a lancha estava atracada no cais da Manaós Harbour, em Manaus, se preparando para mais uma viagem. O comandante, Constantino Queiróz, verificava as condições do rio e os equipamentos da casa de máquinas, garantindo o funcionamento normal da navegação. A bordo, estavam cerca de 142 pessoas, entre civis, militares e tripulantes, com destino a Porto Velho.
A ‘Tupana’ partiu rumo ao sul por volta das 20h, com paradas programadas em Itacoatiara, Borba, Nova Aripuanã, Manicoré e Humaitá. O livro ‘Histórias, Costumes e Tragédias dos Barcos do Amazonas’, de Moacir de Andrade, registrou os detalhes do que aconteceria a seguir.
Emergência e o naufrágio
Nos primeiros dias, a viagem transcorreu normalmente, apesar do calor intenso. A embarcação, projetada para passageiros e carga leve, navegava em boas condições até que, próximo a Humaitá, enfrentou uma forte correnteza e ventos contrários.
Na noite de 5 de outubro, por volta das 22h, as máquinas da lancha falharam repentinamente, um prenúncio do desastre. O comandante tentou acionar o sistema de emergência, mas a força da água arrastou a embarcação para uma área perigosa do rio. Testemunhas relataram que, em poucos minutos, a ‘Tupana’ começou a inclinar para a direita, enquanto passageiros buscavam coletes salva-vidas.
A situação piorou quando parte da estrutura cedeu, permitindo a entrada de água no convés inferior. O pânico se instalou, com alguns passageiros tentando lançar botes e tábuas para se manter à tona, enquanto a tripulação tentava conter a inundação. Logo, a lancha afundou parcialmente, com parte da cabine ainda visível na água turva do Madeira.
Resgate e investigação
As equipes locais iniciaram imediatamente as buscas por sobreviventes e corpos. Moradores ribeirinhos e embarcações particulares ajudaram no resgate e na recuperação de destroços. Entre os passageiros estavam militares, comerciantes e famílias que viajavam para Porto Velho e Humaitá.
O governo do Amazonas abriu um inquérito para apurar as causas do naufrágio. Peritos da Capitania dos Portos analisaram os destroços e ouviram sobreviventes. O relatório preliminar apontou falha mecânica e possíveis fissuras no casco como fatores determinantes.
Além disso, as condições do rio Madeira, com forte correnteza e sedimentos, dificultaram a estabilização da embarcação. O comandante e o prático tentaram direcionar a lancha para a margem, mas a água que invadiu o casco tornou o esforço inútil.
Vítimas e legado
Entre os mortos estavam o prático Constantino Queiróz, o comandante Franklin de Menezes e o tripulante Manuel Augusto de Souza. O comandante foi sepultado com honras militares no Cemitério São João Batista, em Manaus.
A tragédia mobilizou a sociedade manauara e autoridades. O governador da época, Álvaro Maia, decretou luto oficial por três dias, e o presidente Getúlio Vargas enviou condolências às famílias das vítimas.
O naufrágio da ‘Tupana’ foi registrado no livro de Moacir Andrade, como uma das maiores tragédias fluviais do século XX na região. O episódio serviu de alerta para a necessidade de modernizar as embarcações e reforçar a segurança na navegação fluvial, essencial para a vida econômica e social da Amazônia.












