Por Eduarda Dejan
Do cabelo cacheado ao cabelo liso, há quem diga que as mulheres e, até mesmo alguns homens vão adaptando as suas madeixas de acordo com o que a moda pinta. Mas será mesmo que é a moda quem dita essa regra? Ou esse seria um assunto mais voltado para o empoderamento, ou seja: vá e faça o que te faz feliz com aquilo que te faz se sentir bem!?!?
Durante muito tempo, ter um cabelo que não estava no padrão estético determinado para aquela época era motivo para a prática de bullying e até mesmo alguns olhares tortos; muitas crianças e adolescentes ou até mesmo alguns adultos, por exemplo só começaram a alisar o cabelo em uma tentativa de se sentir mais aceito dentro de um grupo. Seja no ambiente escolar ou fora dele. Mas há quem afirme também, alisar o cabelo por pura praticidade, apesar dos gastos.
Para muitos assumir os cachos é um ato de resistência e para outros é possível também ter seu cabelo alisado e amar a sua ancestralidade mesmo assim.
A moda é ser feliz!
“Aos 13 anos, eu convenci minha mãe que eu precisava alisar o cabelo. Sim, eu que quis alisar e minha mãe não queria deixar, porque segundo ela meu cabelo era lindo. Porém, minha realidade na escola não era essa. Eu sofria na escola por conta do meu cabelo; “cabelo de Bombril”, “cabelo sarará”, “cabelo ruim”, entre outros. E isso era massacrante! Não ser aceita porque meu cabelo não era o padrão e trazia muito transtorno, crises de choro e o fato que eu não entendia o porquê”
Esta é a fala da advogada Alana Cecília Vieira Paulino, 31 anos, que alisou o cabelo por 14 anos consecutivos. A decisão para passar pela transição não foi fácil, Alana estava passando por momentos delicados em várias áreas da sua vida quando, por fim, decidiu escolher por agradar a si mesma.

“Daí eu fiz uma promessa pra mim mesma que se eu conseguisse superar o que eu estava passando na época, pararia de querer ser o que eu não era e me assumiria da forma que eu realmente sou. E como toda mulher que está apta a mudanças, tudo começou pelo cabelo. Cabelo é identidade, principalmente de uma mulher de origem afro, com essência e raízes afro”, comenta.
A advogada ainda conta que desde a transição, assim como uma camaleoa, já teve seu cabelo pintado de várias cores, com muitos tipos de trança também. Hoje tudo o que a interessa é seguir o que a faz feliz, e afirma que não existe um padrão para beleza. Diferente do que o mercado da estética vende, a beleza está em cada um do jeito que é.
Praticidade é o que dita a vida
Alisando seus cabelos desde os 13 anos aos 20, a estudante de Jornalismo Rosa Rodrigues diz não se arrepender de ter mudados os fios e afirma que praticidade é o “seu segundo nome”. O flerte com o alisamento começou durante o período escolar quando precisava acordar muito mais cedo que o normal somente para arrumar os cachos, assim, não pensou duas vezes ao pedir para mãe autorização para alisar. “Eu acho que não é uma questão de moda, mas sim da pessoa se sentir bem. Acho que ninguém precisa se adaptar a padrões. Tem coisas que a sociedade acha que tem que ser: nasceu com o cabelo cacheado, fica com ele cacheado, não. Isso é uma questão de gosto e de como a pessoa se sente bem”, finaliza.
A estudante não se importa em gastar um pouco mais para manter os fios a seu favor, conta que para ela é muito mais confortável mantê-los assim do que ter que recorrer a cuidados que seu cabelo natural demanda.

Um pouquinho de história
O alisamento ganhou mercado nos anos 30, com o cabelisadot ou “pente quente”, como era popularmente conhecido. O objeto era composto por um pente e uma haste de metal, a forma era parecida como a da tesoura. O instrumento para alisamento era aquecido em brasa ou até mesmo no fogão e então passado nos cabelos. Esta foi a primeira técnica utilizada para modificar as ondas do cabelo.
Nos anos 50, os produtos químicos começam a ganhar lugar dentro dos espaços de beleza para mulheres. A empresa norte-americana Relaxer desenvolveu um químico à base de hidróxido de sódio, que servia especialmente para mulheres negras que tinham cabelos mais crespos e volumosos. A mesma empresa também desenvolveu outras técnicas, muitas acabaram ficando famosas, a exemplo do “relaxamento”. O nome faz referência à marca.
No final dos anos 90 surge a escova japonesa, criada pelo cabelereiro Satoru Nagata, e, apesar do procedimento deixar um aspecto artificial, ganhou muitas adeptas.
Nos anos 2000, no Rio de Janeiro, um cabeleireiro desenvolveu uma técnica à base de formol. A escova progressiva feita com esse produto causa muitos danos à saúde, por isso, a Anvisa criou um regulamento específico para o uso do produto.
Alisamento em queda
Uma pesquisa realizada no ano de 2016 pela associação Brasileira de Indústria de Higiene Pessoal e publicada pela revista Cláudia mostrou o seguinte: “Em 2015, as vendas de produtos para alisar ou enrolar o cabelo apresentaram uma queda de 26% em comparação com o ano anterior”. Isso poderia indicar que as pessoas, independentemente de sua etnia ou convição cultural, estão procurando cada vez mais deixar de lado os processos para tornar os cabelos lisos.

A diminuição da procura pelo alisamento, trouxe, em contrapartida, a especialização de cabeleireiros por cabelos cacheados. Formada em Direito, Laís Eline de Araújo Oliveira, 26 anos, cabeleireira especialista em cachos, viu em si própria o surgimento de uma oportunidade de trabalho. Laís teve o seu cabelo alisado desde a infância e relata que ao chegar à fase adulta, já não se lembrava mais do seu cabelo natural. “Eu tive muitas referências na família, também. Minhas tias por parte de pais, minhas primas e até artistas de televisão, todos tinham o cabelo alisado. Na época eu achava muito bonito, porque não tinha consciência e nem conhecimento sobre”, finaliza.
Laís abriu o próprio salão em plena pandemia e conta que por suas mãos passam desde mulheres que querem diminuir o volume do seu cabelo, até aquelas que querem entender e aprender mais sobre si “ e eu recebo muita cliente que chega aqui, senta na cadeira e fala assim: ‘ai virou moda agora aceitar o cabelo’, não está na moda. É um cabelo que está ali há tempos só que as pessoas não aceitavam”, comenta.
Referências
Moda ou não, os cachos estão ganhando cada vez mais adeptas de todos os continentes e que estão cada vez mais exigentes também, nos cuidados com os seus cabelos. Hoje a indústria da beleza contabiliza vários tipos de produtos que vão desde mais industriais até os da linha vegana. Mesmo que por moda, na atualidade não há uma única referência a ser seguida. Com o surgimento de vários e várias blogueiras nas redes sociais, está cada vez mais fácil encontrar uma referência para chamar de sua e se espelhar para ser feliz!