Pesquisadores da Embrapa Agrobiologia (RJ) desenvolveram um novo bioinsumo – um tipo de inoculante – que pode impulsionar a recuperação de áreas degradadas em todo o Brasil, incluindo a Amazônia. A tecnologia, capaz de atender pelo menos 31 espécies florestais leguminosas, simplifica a técnica de recuperação de solos com microrganismos, já conhecida por sua eficácia desde a década de 1990.
O produto, em fase final de desenvolvimento, promete fortalecer o mercado de bioinsumos no país, oferecendo uma solução mais eficiente para a reabilitação de áreas afetadas pela mineração, erosão, desmatamento ou urbanização desordenada. A inovação elimina uma das principais dificuldades na adoção da técnica em larga escala: a necessidade de escolher uma bactéria específica para cada tipo de planta.
Das mais de 800 estirpes de rizóbio (bactérias benéficas que vivem no solo) isoladas pela Embrapa, duas se destacaram por sua capacidade de estabelecer uma relação simbiótica eficiente com 31 espécies florestais, abrangendo tanto leguminosas nativas quanto espécies de valor comercial.
“Com essas estirpes, conseguiremos eliminar uma das principais barreiras à adoção dessa técnica em larga escala, que é a especificidade entre bactéria e planta hospedeira”, explica Sérgio Faria, pesquisador da Embrapa Agrobiologia. Segundo ele, o novo bioinsumo permitirá o desenvolvimento de produtos multiespécies, capazes de atender diversas plantas em projetos de restauração ambiental em todos os biomas brasileiros.
A redução de custos e a simplificação da logística são outras vantagens. O objetivo é fornecer aos viveiristas e responsáveis pela restauração ecológica um único produto, eficiente para diferentes espécies utilizadas na recomposição florestal em todo o país, sem comprometer a fixação de nitrogênio no solo.
Trinta anos de pesquisa para recuperar o que parecia perdido
A técnica de recuperação de solos com microrganismos surgiu há mais de três décadas, como uma alternativa para regenerar áreas severamente degradadas, especialmente em regiões mineradas. Inicialmente, os testes foram realizados com menos de dez espécies de leguminosas com potencial madeireiro, como sabiá, gliricídia e saman. Hoje, a Embrapa acumulou uma base de dados com centenas de espécies com potencial de uso em todos os biomas, da Amazônia ao Semiárido.
“Começamos com poucos exemplos e hoje temos informações que orientam o uso de leguminosas para praticamente todas as condições de solo e clima do País”, observa o pesquisador Alexander Resende.
O papel invisível dos microrganismos
O segredo da tecnologia está na simbiose entre plantas e microrganismos. As bactérias do gênero Rhizobium colonizam as raízes das leguminosas, formando nódulos onde capturam o nitrogênio do ar e o transformam em uma forma que a planta pode usar. Já os fungos micorrízicos expandem o sistema radicular da planta, facilitando a absorção de água e nutrientes, como o fósforo.
Essa relação de troca promove o crescimento das plantas, mesmo em solos pobres, e acelera a formação de matéria orgânica, reativando processos ecológicos essenciais.
Resultados promissores em campo
A técnica já foi aplicada com sucesso em áreas de mineração de bauxita e ferro na Amazônia e em Minas Gerais, em jazidas de piçarra no Rio Grande do Norte, e na recuperação de encostas e voçorocas no Rio de Janeiro. Há também registros de uso em projetos de restauração na Caatinga e no Cerrado, sempre com resultados consistentes.
Após cerca de um ano, a vegetação começa a cobrir o solo e a erosão é controlada. Em quatro ou cinco anos, a área se assemelha a uma floresta jovem. Estudos indicam que, após uma década, a fauna local retorna e mais de 40 novas espécies vegetais colonizam espontaneamente a área – um número que pode chegar a 70 na Amazônia.
Sustentabilidade e metas globais
Além de reduzir custos, o uso do bioinsumo contribui para metas de sustentabilidade, como o Código Florestal, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) e os compromissos do Acordo de Paris. Ao diminuir a necessidade de adubos nitrogenados químicos, a tecnologia evita perdas de nitrogênio para o meio ambiente.
“Estamos na década da restauração, e com a COP30 acontecendo na Amazônia, é essencial mostrar soluções brasileiras baseadas em ciência e na natureza. As leguminosas inoculadas com microrganismos são uma das ferramentas mais eficazes para recuperar funções ecológicas em áreas degradadas”, complementa Resende.











